A elevação da ureia em felinos, nem sempre indica doença renal

Quando um gato apresenta níveis elevados de ureia no sangue, muitos tutores logo se preocupam com a possibilidade de um problema renal crônico. No entanto, é importante ressaltar que uma alteração na concentração de ureia sérica nem sempre indica uma condição diretamente relacionada aos rins. Diversos fatores podem influenciar esse resultado, como desidratação, doenças gastrointestinais ou até mesmo dietas ricas em proteínas.

Para diagnosticar corretamente a origem do problema, é essencial realizar uma investigação completa.

Avaliação Pré-Renal, Renal e Pós-Renal

1. Causas Pré-Renais: A elevação da ureia pode ser resultado de problemas pré-renais, ou seja, antes de qualquer comprometimento direto nos rins. Geralmente, essas causas estão associadas à desidratação, hipotensão ou choque, condições que diminuem o fluxo sanguíneo renal. Nesses casos, os rins não conseguem eliminar adequadamente os resíduos do metabolismo, como a ureia. A fluidoterapia pode resolver essa situação, restaurando o fluxo sanguíneo e, consequentemente, normalizando os níveis de ureia.

2. Causas Renais:As causas renais estão diretamente relacionadas à função do parênquima renal. Em felinos, as doenças renais crônicas são comuns, especialmente em animais mais velhos, mas é importante não assumir que toda alteração nos níveis de ureia seja decorrente de um problema renal. Para identificar se há comprometimento estrutural nos rins, é essencial realizar um ultrassom abdominal, que permite a visualização detalhada do parênquima renal, avaliando a relação córtico-medular. A urinálise, idealmente realizada por cistocentese, é outro exame crítico, pois permite a análise de concentrações urinárias, a presença de proteínas, sedimentos e outros indicadores de função renal.

3. Causas Pós-Renais:As causas pós-renais envolvem obstruções ou problemas após o funcionamento normal dos rins. Um exemplo clássico é a obstrução uretral, que pode elevar a ureia devido à incapacidade do gato de eliminar adequadamente a urina. Esse tipo de problema é uma emergência veterinária e requer intervenção imediata. Além disso, não apenas uma obstrução total pode causar danos: uma estenose (estreitamento de um ureter ou da uretra) também pode provocar sérios problemas. As obstruções e estenoses podem ser diagnosticadas por meio de exames de imagem, além de observação clínica dos sinais, como dificuldade ao urinar, alterações na quantidade de urina, vocalização de dor e lambedura incessante do órgão genital, o que indica desconforto ou dor.
   

Exames Essenciais

Além do hemograma com avaliação bioquímica, que fornece informações valiosas sobre o estado geral de saúde do animal, o ultrassom abdominal é imprescindível. Esse exame permitirá uma análise detalhada do parênquima renal, verificando a relação córtico-medular, o que pode ajudar a descartar ou confirmar a presença de alterações estruturais nos rins.

Outro exame essencial é a urinálise, que deve ser realizada com uma coleta precisa de urina, preferencialmente por cistocentese (punção da bexiga). Isso garante uma amostra livre de contaminação e permite uma análise mais acurada dos parâmetros urinários, fundamentais para avaliar a função renal e a presença de possíveis infecções ou outras condições.

Desidratação

A desidratação é uma causa comum de elevação da ureia, classificada como uma alteração pré-renal. Nesses casos, os rins estão funcionando corretamente, mas a falta de líquidos no corpo impede a filtração adequada de resíduos. Antes de se preocupar com uma possível doença renal, é importante garantir que o felino esteja devidamente hidratado. Somente após reverter a desidratação, o veterinário pode avaliar se a ureia elevada é uma consequência transitória ou indica um problema mais grave.

Por outro lado, se o hemograma indicar que os marcadores da série vermelha estão baixos, a fluidoterapia pode piorar o quadro do animal. Além disso, um animal com alimentação inadequada não deve receber uma carga de proteínas sem a ingestão hídrica adequada. Vale lembrar que a ureia também pode aumentar com uma ingestão excessiva de proteínas.

Atenção e Cautela

A cautela é essencial no manejo de felinos com elevação de ureia. Nefrologista é o médico veterinário especializado em avaliar possíveis quadros de deficiência na função renal.

Imagine um felino de 9 a 12 anos que chega ao consultório com relato de hiporexia (está comendo menos), comportamento mais quieto, e o tutor menciona uma "perda de massa muscular". O hemograma mostra uma série vermelha comprometida: • Hemólise acentuada; • Plaquetas baixas; • Presença de células de rouleaux e agregado plaquetário. • O felino não está desidratado.

• O exame bioquímico não confirma degradação muscular como causa do aumento da creatinina sérica, mas há elevação na ureia e no fósforo. • Não há febre.

Com esses resultados, nenhum médico responsável fecharia um diagnóstico precipitado. Um curandeiro talvez sim, mas um médico veterinário, jamais.

O que um resultado de exame com essas características indica?

O felino estava estressado demais no momento da coleta, o que afeta a qualidade do sangue coletado. O aumento da ureia está indefinido. É preciso prestar atenção especial aos glóbulos vermelhos e, possivelmente, administrar a medicação adequada para estimular sua produção. O Médico Veterinário saberá se e qual.

A alimentação deve ser cuidadosamente ajustada, garantindo a ingestão aumentada de líquidos. Forçar o consumo de proteínas não resolverá o problema. Conclusão

Elevações na concentração de ureia sérica nem sempre são sinônimo de doença renal crônica. Diferenciar entre causas pré-renais, renais e pós-renais é essencial para um diagnóstico preciso e um tratamento adequado. Exames como o hemograma, ultrassom abdominal, urinálise e a avaliação do estado de hidratação são indispensáveis nesse processo. Consulte um veterinário especialista em felinos e um nefrologista veterinário para garantir que todos os exames necessários sejam realizados e que o tratamento correto seja iniciado.

Até o próximo post!